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5 de março de 2013

O Deus presente

 
No capítulo 11 do livro de João temos uma narrativa bíblica singular sobre Jesus e o seu ministério. Essa narrativa nos revela o que a teologia chama de “antinômio”, ou seja, quando duas verdades bíblicas parecem não fazer sentido. No caso da passagem, temos a dupla natureza de Cristo: divina e humana. Podemos perceber a natureza divina quando Ele sabe que seu amigo Lázaro irá morrer [Jo 11.11-14].
 
Já ouvi muitos dizerem, com todo o respeito, que Jesus parece cínico nesse texto. Afinal, chorou por um amigo que sabia que morreria, e, inclusive, ressuscitaria.
 
Gosto do diálogo que a teologia faz com a literatura e até mesmo com o cinema. Sou fascinado com o filme Contra o Tempo, protagonizado por Jake Gyllenhaal e Michelle Monaghan, pelo conteúdo significativo que aponta para Cristo. Jake Gyllenhaal, que vive o capitão Colter Stevens, recebe a missão de entrar na mente de um homem morto através do chamado “código fonte” e acessar resíduos de oito minutos que ficam ativos na mente mesmo depois que a pessoa morre. Esses oito minutos ocorrem em um trem para Chicago que explode matando várias pessoas. Ao fim do tempo, ele perde o acesso à mente e volta para sua realidade. Tudo isso para descobrir a bomba e o terrorista que irá cometer outros ataques.
 
O capitão Colter Stevens sabe que, sempre ao fim de oito minutos, verá o trem explodir da mesma forma. São cenas repetidas em que ele pode improvisar livremente para cumprir sua missão. Em dado momento, apegado à realidade paralela dos oito minutos, ele decide, mesmo sabendo o final, se aproximar de Christina e ser tocado pelo momento. A partir desse instante, tenta mudar a realidade rotineira dos que o cercam, que vivem vidas amargas. Deixa a mensagem de que mesmo estando tudo maquinado contra nós, não precisamos ser amargos como o mundo.

Aquele capitão falava de Jesus. O Jesus humano, que sendo divino e onisciente, conhece o futuro amargo e quer vivê-lo junto conosco. Sabe que tudo irá explodir, mas insiste em não nos deixar. Não faz parte desta realidade, mas por nós escolhe fazer. Deus não perde sua soberania sendo visto como humano. Ele é divino sendo humano. Onipotente como Ele é, escolheu poder ser tocado pela situação de um amigo [Jo 11.35], e também por nossa miserável situação. Após cumprir sua missão, o capitão Stevens quer voltar para salvar a todos do trem, mesmo sabendo que tudo não passa de imaginação, uma vez que estão todos realmente mortos. Graça onde há desesperança.
 
Não há cinismo em Jesus. Ele é tão soberano quanto humano. Esse Jesus, amigo de Lázaro, é o nosso Jesus, que nos acompanha e também chora nossas dores. O escritor francês Victor Hugo em seu clássico “Os miseráveis” entendia isso. Dessa forma, escreve sobre o sofrimento de sua personagem Fantine, de vida miserável, uma sentença cheia de esperança:
Que as nuvens todas se descarreguem sobre ela, que todo um oceano passe por cima de sua cabeça! Que importa! É uma esponja embebida. Assim o crê, pelo menos; mas é um erro pensar-se que o destino se cansa e que se pode chegar ao fundo do que quer que seja.O que são, porém esses destinos impelidos em tal confusão? Para onde dirigem? Por que agem dessa maneira?Aquele que sabe penetra toda esta sobra.Ele é único. Clama-se Deus
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Mateus Octávio Alcantara de Souza tem 20 anos, é Bacharel em teologia e escreve no blog Meditações*

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